quarta-feira, 25 de junho de 2014

Happy Hour (4)

Mon professeur Don Juan m’a appris que «las cosas de palacio se hacen despacio...»


«... despacito.» Tu ne crois pas? Viens voir.

segunda-feira, 23 de junho de 2014

Una folla entre folhas
[parte 2]

(parte 1)

Encosto-me à porta, a uns quatro metros dele. Fico ali por alguns instantes, observando os tigres que saltam nos seus olhos. Aproximo-me, enlaço-lhe os pulsos com as minhas mãos, ensaio um pas de deux em câmara lenta. Repito a ordem:

— ¡Dime lo que sientes, lo que quieres hacer!»

— Quiero... qui-e-ro... hum...

Arranco-lhe a roupa e já as línguas se soltam em fúria pelas colinas, torres, vales, rios dos corpos-mapa-múndi. Redemoinham bocamamilos, bocapiça, bocacona, bocadedos que se afundam grutabaixo, se alçam estalagmitacima, estalam ronronanços deleitosos, dédalos minetáuricos, arroubos feláticos, multiosculamente, amarramplexicamente. Encabriolam-se, piruetam-se membros volutos, penetrantávidos, metecúnicos.

— ¿Que quieres tú? Así? Hum...

— Sí... sí... ¡Qué bien que lo haces!

— No pares, ¡dámelo todo!... Hum, describe en tu lengua lo que estás haciendo.

Reduzimos frases a interjeições, palavras a sílabas, a ofegâncias saliváticas, em contracurvas, num vórtice abissal-avassalador, em denunciadora panglossolalia.

Passos no corredor impõem-nos tréguas. Mergulhamos num súbito silêncio, só se ouve o tamborilar do coração nos peitos suados. Os passos não cessam, aproximam-se. Ainda bem que o Verão permite cobrir os corpos num ápice, mas não absorve o rumor de movimentos rápidos. Disfarçar emendará mal o soneto. Levantamo-nos dos grossos tomos jacentes, entra o segurança.

— El reglamento no permite...

— ¿Donde está escrito que no se puede follar aquí? ¡Enséñemelo, por favor!

— Señora, le digo que esto no se puede hacer...

— ¡Vaya con Dios, señor!

Saímos, mal refeitos da intromissão e, mudos, trocando sorrisos e carícias discretas, dirigimo-nos à sala de leitura tentando reatar o cogitus interruptus.

Ajudai-me, santos da paciência, deuses da contenção, reuniu-vos em consílio urgente, decidi a favor desta cona não saciada!

sexta-feira, 20 de junho de 2014

Una folla entre folhas
[parte 1]

As bibliotecas sempre me inspiraram. Aquele ambiente de saber, o silêncio de insuspeitos pecadores, os movimentos lentos dos leitores, os olhares pesados da leitura prolongada em busca de alívio, num decote, numa cintura, numa linha de lábios, num certo jeito de pegar nos in-fólios, lubrificam-me os neurónios, estimulam-me as fendas sinápticas.

Obrigações e paixão pela leitura de textos escassamente editados têm-me levado a passar tardes, dias inteiros e até parte da noite, nalgumas bibliotecas de acervos ricos. Têm sido oportunidades para viajar, conhecer mundos e gentes. É uma maneira interessante de conhecer homens com afinidades com o meu gosto pela leitura, sem precisar de o testar, avançando, portanto, esta etapa de empata.

Era em Madrid, num dia em que os termómetros de rua haveriam de marcar, às 20 horas, 42 graus. Contava seis dias completos de pesquisa aturada, muitas horas de cabeça baixa, de corpo soterrado na cadeira desconfortável, quando me aconteceu uma necessidade impreterível de arejar a vista. Faço um scan da sala, em busca de uma boa razão para interromper o trabalho. De repente, paro num par de olhos cravado em mim há mais tempo do que o de quem olha-sem-estar-a-ver. Um ímpeto leva-me até aos pulsos que emergem de um punho de camisa dobrado, desnudando-os. Parecem uma flor grande (glande, diria a minha vizinha oriental da cadeira ao lado da minha). Concentro-me naqueles centímetros de pele bronzeada que molda uma musculatura tensa, sugerida pela firmeza dos gestos. Sigo-lhe os movimentos, qual passarinho enfeitiçado e engulo em seco. Aquelas mãos, aqueles pulsos delicados apenas o suficiente para pertencerem a um príncipe, irredutivelmente viris, o que me fariam? Ah, mas é tão jovem, que jovem é, Méssaline! — diz-me o hemisfério esquerdo, sempre pronto a inibir a femme cougar, perante um potencial toy boy. Je m’en fous! E a pergunta desce às portas do hipotálamo que não a enjeita. Bem sei o que queria que me fizessem aqueles dedos longos.

Queria-os de surpresa, por detrás, a rodearem-me brandamente o pescoço, a atreverem-se colo abaixo... e as mamas sobem-me e descem-me ao ritmo do peito ofegante.

Queria-os, ainda por detrás, a aventurarem-se por dentro da cintura da saia, a roçagarem-me no ventre e a encherem-se com as minhas ancas... e fecho os olhos para sorver a onda de tusa que ameaça atirar-me para a transgressão do regulamento bibliotecário.

Queria-os, eu com as pernas abertas sob a ampla e longa saia, ele à minha frente, olhos nos olhos, como gosto e exijo, a conduzi-los pelas pernas acima, a fazê-los deterem-se no meio das coxas... e a cona a animar-se, humectante.

Queria-os a entrarem nela, com a sapiência da suavidade e da delonga. Ah! Mas os jovens...

Os olhos continuam a não conseguir evitar-me. Sabem já que lhes quero alguma coisa e não querem adiar o que os meus lhe prometem. Mas como, como aliviar o corpo num templo (passe a redundância) concebido para responder às exigências do espírito? Não sei, isso logo se verá, talvez...

Eis que se levanta. Suspiro, dirige-se a mim. Ah, não, depois de quase me fazer uma tangente, continuou caminho até ao balcão. Ouço-o sussurrar. A prosódia é de quem procura alguma coisa, um livro, claro, Méssaline, que outra coisa havia de querer? Tenho pouco tempo. Escrevo numa folha do moleskine: «¿Le apetece un café?». Ele regressa à mesa de trabalho. É a hora! Antes de chegar, aproximo-me da sua mesa e deixo cair o bilhete sobre o livro aberto.

Agora finjo que leio, mortinha por desfingir. O coração acelera e espalha-me um frémito pelo corpo. Ele senta-se e repara na missiva. Olho-o de frente, séria do que (ainda) não é. Ele sorri-me a confirmar a autoria. Levanto-me:

— ¿Viene?

Ele segue-me, eu não sei bem o caminho para o bar, mas também não me interessa. Deixada a sala de leitura, percorremos longos corredores e falamos do que lemos, do que fazemos. O sotaque do espanhol sul-americano vibra-me nos ouvidos. Veio para aqui por Cela (procelas de sensações túsicas é o que me causa esta fala musical). Paramos um pouco, enfio-lhe os olhos pelos seus adentro, sossegados. Sorri, os pulsos tocam os meus. Fico um condutor de electricidade. Mas prosseguimos. Tomamos o café, eu comento a frustração por esta beberagem espanhola. Creio que não sabe bem ao que me refiro, mas também não interessa, que o meu pensamento está já todo dentro daquele armazém que vi entreaberto. A conversa desliza para os carnavais de Cela. Paro e digo-lhe que não resisto à carnavalização bakhtiniana do que é sério, canonizado, na literatura, e também em muitos momentos da vida. Os olhos chispam-lhe, e lembra-me que há coisas que não devem passar por esse processo destrutivo, desconstrutivo. Desafio-o:

— Por ejemplo, ¿qué?

— La belleza de tu rostro. Sería un crimen profanar a tus estupendos labios.

Confesso que não esperava. Confesso também que me puxou esta provocação:

— ¿Qué crees que profanaría mis labios?

— Una enfermedad.

Muito bem! O moço-pulsos-de-príncipe, tão precoce na consciência da humanal condição!

Seguro-lhe os pulsos — a causa primeira desta andança — e retribuo:

— Tus bellas muñecas las profanaría una guerra. Matarían como suelen hacer los jóvenes varones en las guerras. Pero vivimos en paz, afortunadamente. Hay que aprovechar, ¿no te parece?

E conduzo-o, pelos pulsos, ao armazém isolado. Subo as minhas mãos pelos seus braços, sob a camisa. Ele respira fundo, fecha os olhos e levanta o queixo. De pé, imóveis, desaperto-lhe os botões sobre o peito, devagar. Ele tenta retribuir as carícias. Eu detenho-o:

— ¡Quédate y dime lo que sientes, lo que quieres hacer!

Balbucia qualquer coisa que não chega a palavra.

Fecho a porta.

[Continua, mas não farei como o Sr. Eça de Queirós que nos fechava a porta dos quartos das personagens com reticências, e abria o parágrafo seguinte com outra hora, outro dia. Prometo!]

quinta-feira, 19 de junho de 2014

Ó bons leitores impuros!

Méssaline gosta do Norte e por isso vai várias vezes ao Porto, viagens e visitas de que guarda mui boas memórias. Da última vez, boca amiga deu-lhe a conhecer o slogan de Alexandre O’Neil que a atmosfera beata do Estado Novo não podia ter aceitado:

BOSCH É... BROM!

Méssaline ficou de boca aberta... de espanto...

De regresso, no comboio, meio de transporte da sua preferência pelas fantasias que inspira, Méssaline leu duas vezes — sim, duas seguidas — a última, e já extinta nas livrarias, publicação de Herberto Helder*, A morte sem Mestre, e não resiste a partilhar o poema-pórtico:

«Nunca estive numa só linha a tão vertiginosa altura,
Oh Anjo Príapo, oh Nossa Senhora Côna!
Quando nos vimos nus um em frente ao outro,
Em nossa primeira noite nos começos do mundo,
O putedo sai que entra pelos quartos à volta
— peço por isso que um qualquer erro de ortografia ou sentido
Seja um grão de sal aberto na boca do bom leitor impuro.»


* (Méssaline confessa que este poeta lhe desperta instintos lúbricos, com aquela língua de fogo, aquele trato arredio, aquele comportamento fugidiço...)

sábado, 14 de junho de 2014

Rubras que te quero rubras

Porque o tempo das cerejas (ainda) está aí, Méssaline recupera um texto dos “primórdios” da Boîte.

«Convidaste-me para apanhar cerejas, essa dádiva aos sentidos: gama de vermelhos rosados até aos sanguíneos, luzidia, polpuda, doce e de dentada carnosa.

Levava um vestido boticelliano para que a mais leve brisa mo levantasse e para festejar a Primavera. Começámos pelas de baixo. Tu provavas e interjectivavas com entusiasmo: «Hum, que boas! Toma esta, que é doce e rija» e metias-ma na boca, olhos nos olhos. Eu contornei a cerejeira e apareci-te com os folclóricos brincos e disse-te: «Toma». Agarraste uma com a língua e prosseguiste pescoço abaixo até ao decote, onde despontavam duas, muito rubras. Comeste-as e mordiscaste-me os mamilos. [...]»

[Texto integral em «Oh, le temps des cerises».]

sexta-feira, 6 de junho de 2014

Avaliação de desempenho

Nos primeiros anos após acabar o curso trabalhei no gabinete técnico de uma entidade pública. Acho que entretanto a coisa mudou, mas na altura a avaliação anual do desempenho funcionava pelo método “chapa cinco”: era toda a gente corrida a “Suficiente”, dos imprestáveis aos notáveis. E, até à minha entrada na equipa, vivia tudo na santapazdedeus.

Então — sacrilégio! —, submeti um requerimento para ter direito a um processo digno do epíteto de «avaliação». Estava tudo previsto nos esquecidos regulamentos da Função Pública (relatório de autoavaliação, formação do júri, audiência, etc.), mas o pedido caiu como uma bomba no serviço e até apanhou desprevenidas as chefias, que não faziam a mínima ideia de como a “coisa” de fazia.

Dias depois, enquanto ainda esperava pela audiência de avaliação, cruzei-me com colegas à volta da costumeira máquina de café do átrio. A certa altura, alguém, com um mal-disfarçado tom de recriminação, comentou que não percebia por que tinha eu feito tal requerimento: com “Bom” ou “Suficiente”, no fim do mês ganhávamos todos o mesmo...

«Sim, é verdade», reconheci. «E é pena e uma injustiça que assim seja. Mas, mesmo sendo-o, exijo ao menos o reconhecimento formal do meu empenho e desempenho. Porque, no que a mim diz respeito, ponho empenho em tudo o que faço e procuro ser sempre o melhor possível.» E acrescentei, num tom que garantisse que todo o átrio ouvia: «Quando faço um projecto, quando escrevo, quando cozinho para alguém, quando FODO!, não é para ser apenas “Suficiente” ou aceitável — é para ser Bom, Muito Bom ou Excelente.»

quarta-feira, 4 de junho de 2014

terça-feira, 3 de junho de 2014

Happy Hour (0)

A partir de amanhã, Méssaline convida os leitores para a sua «Happy Hour», oferecendo um shot de foto legendada. (Quase) todas as quarta-feiras, como refrigério.

domingo, 1 de junho de 2014

Méssaline Salope @ Erotika #8

É com grande prazer (o que, num blog desta natureza, dá jeito...) que Méssaline Salope faz saber que dois dos seus textos foram publicado no n.º 8 (Junho/Julho) da Erotika, revista online e gratuita que saiu este fim-de-semana.

O primeiro desses textos é «Fim de tarde na praia», “guião” bem apropriado à época estival que se aproxima e que, deo volente, será propícia ao fornício; pode ser encontrado nas páginas 32 a 34.

Na mesma edição da revista, saiu também o meu soneto petrarquiano, «Se piça não é, qual é meu divertimento?»: página 55.

Mas o que se recomenda é que leiam/vejam a totalidade da revista, que aborda diferentes aspectos da sexualidade, dos mais lúbricos aos mais informativos, passando pelos estéticos e literários.


Se tudo correr como o previsto, a partir do próximo número, Méssaline iniciará uma colaboração regular com a Erotika, então já com textos inéditos.