segunda-feira, 25 de agosto de 2014

Voyage, voyage (3):
Una giornata particolare

(parte 2)


Estava eu neste brando desassossego, quando, ao longe, ouço soar a tão bem conhecida música da língua italiana. Saltou-me a passarinha, retiniram campainhas interiores e exteriores, toda eu um ouvido só, grande, elefantino. Huumm, as vogais bem abertas e com curvas melódicas, o bater vigoroso das consoantes oclusivas, a efusão das chiantes... toda esta cadência expirada em máscula locução... Mamma mia!

Fui ver. Comunicava com o Charles num cómico inglitaliano. Ao ver-me, saudou-me como quem compromete todo o corpo no gesto: Buongiorno, signora! E o sol abriu-se no seu sorriso. Apresentámo-nos, era mais um amigo do Loïc, Marcello, di Roma. Convidou-nos — a mim e ao Charles — para o acompanharmos num passeio nel bosco. O Charles recusou gentlemanamente, eu aceitei, alegremente.

O italiano falava bastante, mas não me cansou os ouvidos sedentos da música da sua língua. Eu flutuava na onda da sua fala, movida pela visão dos gestos largos dos seus braços e pernas, pelas súbitas pausas dos seus olhos nos meus lábios. Falámos de livros, de cinema, de arquitectura, sua área profissional. Eu disse-lhe que para mim a palavra «Itália» era um passaporte instantâneo para a Viagem, ele perguntou-me o que conhecia do seu país.

O Marcello tinha combinado jantar na cidade, sugeriu que eu fosse. Não me apetecia ver muita gente, viera para repousar, declinei o convite com estas exactas razões.

Ao jantar, falei ao Loïc dos seus amigos, do inglês, para disfarçar o interesse no italiano. Talvez tenha percebido, porque passou mais de meia hora a falar do Marcello, a quem encomendara um projecto de restauro da ala nascente do château. Falou do seu extraordinário humor, agora beliscado pelos reveses de um delicado divórcio.

Deitei-me, peguei numa revista para adormecer, mas os gestos e as palavras daquele italiano não me abandonavam. Embrulhavam-se-me no corpo, amotinavam-se-me na cabeça.

Acordei com o Marcello ainda a boiar-me no hipótalamo, mas agora apenas a sorrir, a sorrir. Era de noite ainda, desci à copa para procurar alguma coisa para comer.


(continua)

3 comentários :

  1. Hummm...
    Mulheres facilmente impressionáveis...
    Ahhh como eu gostaria de saber fazer isso!!!

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    1. Se há coisa que Méssaline não é, é ser facilmente impressionável.
      A maior parte dos homens não impressionam Méssaline. (O que, diga-se, melindra não poucos.)
      O Charles não impressionou Méssaline.
      Dizer que o Marcello beneficiou da facilidade impressiva (?) de Méssaline é não conhecer Méssaline nem ter conhecido o Marcello.
      Bisou. :-)

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  2. Méssaline .... femme fatale!
    je te suis......

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